Por Ti Seguirei... (34º episódio)

 

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O dia terminava com segunda visita às termas, antes do regresso ao palácio e a replicado lauto repasto.

Na manhã seguinte, enquanto visitavam as fortificações, subindo a uma das torres de madeira que, entalhadas na muralha ciclópica, dominavam a área circundante a longa distância e centravam a defesa de uma das principais portas do povoado, avistaram uma coluna de pó, dispersa ainda nas planuras do caminho que cavava na terra e na fraga o acesso a Óbila.

A coluna deveria ser abastada de gentes e animais, tal a cortina de inertes.

O caudilho responsável por aquele sector defensivo apressou 5 guerreiros ao encontro da caravana que se aproximava, como prevenção para acasos intempestivos ou premeditações hostis inesperadas e desagradáveis. Os homens saíram a toda a brida, incitando os cavalos com gritos estridentes.

Não demorou muito para que se verificasse que os sinais de movimento estagnavam e paravam de todo. O céu ficou novamente límpido, nos seus tons de azul carregado, arautos da chegada do estio, sobre a área que concentrava os olhares dos expectantes.

De regresso, os batedores anunciaram, em grande alarido, a chegada de comitivas de povos do Sul, que se apresentavam para os jogos. Turdetanos, Túrdulos, Cónios e Batestanos aceitaram o convite formulado e puseram-se em viagem, agrupados.

No conjunto, entre chefes e ilustres tribais, guerreiros, concorrentes ou apenas de escolta, respectivas famílias e outros parentes que não de sangue, somavam uma horda semelhante a um pequeno exército.

Havia que os provir de lugar de assentamento dos respectivos arraiais e do sustento que fosse necessário. Bem como, era manifesta a preocupação atender à concepção de uma logística que acautelasse eventuais altercações, tão comuns entre indivíduos com hábitos e costumes distintos. Alguns, mesmo, com reservas e ódios exacerbados, de tal modo ancestrais, que já não havia memória dos motivos da sua gestação.

Talauto deu instruções claras, ordenando que os conduzissem a um pequeno bosque de bétulas, nas imediações da cividade, a Oeste. Aí acampariam, podendo entrar em Óbila à vez, em pequenos grupos, garantindo-se assim o cuidado com as questões de manutenção da segurança e da ordem pública. Deveriam designar interlocutores para curarem da sua estadia com os organizadores. As chefias seriam convidados para todos os jantares no palácio, enquanto fossem hóspedes naquelas partes.

Nos dias seguintes, assomaram ao local os restantes séquitos das tribos que responderam ao chamado.

Do Poente, chegaram caravanas dos conterrâneos de Rubínia, Tongídio, Alépio e Zímio (por adopção) – para grande alegria destes -, os aguerridos Lusitanos e Calaicos, na sua miscelânea de povos.

De áreas mais a Norte da Ibéria, apresentaram-se representantes das tribos dos Astures, Cantábricos, Vascões e Vacceus. Urtize reunia-se novamente ao seu líder e conseguia finalmente um sorriso - ainda pouco expressivo -, de Gurri, no reencontro.

De Nascente e centro da meseta ibérica, nenhum povo compareceu. A forte presença militar romana impedia qualquer delírio de enfraquecimento das defesas dos lugares e tornava a própria deslocação numa grande e, possivelmente, fatal aventura.

Nunca uma só região havia concentrado e reunido os clãs de tantas sortes e cantos da Ibéria. Algo de novo e de grandiosa importância estava a acontecer.

E os Romanos já o sabiam. Por isso, prepararam planos para minar o evento e convertê-lo em mais uma manobra de conquista...

Com muito espanto e acrescidas reservas, já com todos os convidados instalados e com o quotidiano de Óbila adaptado às novas e pontuais circunstâncias, Talauto teve de descer uma vez mais às portas principais da cidade para receber e dar tímidas – para não dizer, desconfiadas – boas-vindas a um último grupo que se apresentava para os jogos: a comitiva dos Arévacos!

 

Quando os Romanos surgiram em Pallenda, ostentando o seu poderio militar, desfraldado ao vento pelos estandartes da Legião e carimbado no solo pelos milhares de caligae, e ficaram ao corrente da fuga dos prisioneiros que tanto queriam recuperar, para punir e limpar a grave derrota sofrida junto a Sekia, decidiram que começariam ali mesmo a lição e o exemplo da sua presente e futura autoridade e domínio. Cercaram Pallenda com garrote asfixiante. Só quando os habitantes, já muito carentes e em definhado estado, entregaram os arévacos rebeldes que haviam auxiliado na fuga dos celtas, é que permitiram o abastecimento de água e alimento à população.

Para júbilo dos líderes tribais e demais simpatizantes com o invasor, todos os que voluntariamente se entregaram aos sitiantes, para salvar o seu povo, foram impiedosamente torturados, até denunciarem os correligionários rebeldes e informarem da direcção tomada pelos evadidos, ou expirarem com os segredos por revelar. A resistência à dor provocada pelas brutais sevícias e a demora na extracção da informação criaram a oportunidade de fuga a Irineu e aos seus companheiros ainda não indiciados. O cerco romano afrouxara e, a coberto da noite, escaparam por caminhos pouco usados.

Num gesto final de crueldade intimidatória, cravaram os sobreviventes da flagelação, pelas mãos e pés, na mesma árvore da praça central, onde estiveram acorrentados Tongídio e Rubínia.

Deste o modo, os Romanos ficaram a saber do destino provável dos celtas e, mais ainda, dos jogos organizados pelos Vetões e das consequências que daí poderiam resultar, muito adversas aos interesses de quem pretendia dividir para reinar.

Com os aliados de Pallenda, os romanos prepararam nova estratégia: enviar uma comitiva de arévacos para os jogos, incluindo duas dezenas de legionários disfarçados. Seriam foco de distracção e conflito durante o evento, enquanto as legiões romanas tomariam posições para atacar e acabar de vez com a resistência e autonomia dos iberos, aproveitando a reunião de tão grande número dos seus líderes. A Águia Romana preparava-se para a rapina decisiva, de um só golpe.

(continua)

 

Andarilhus

XVI : III : MMXI

publicado por ANDARILHUS às 19:22