Turris Babel

"A Confusão das Línguas" por Gustave Doré (1865)

AGORA que me libertei do peso da gravidade, agora que me suspendo novamente pelos cordelinhos dos sonhos, arrisco subir razão e coração ao alto do desejo, ao cume dos projectos.

Já me despeço de príncipes, castelos e feitiços. Digo adeus a amores idílicos, a buscas da companhia perfeita e a grandes feitos cavaleirescos. Já não morro por um ideal? Não sei. Não sei se a mudança é tão extremista na condução da alma pelos campos da nova sementeira… Será a mudança a matar-me? Não, acho que vou deixar um rasto de pequenos seixos para poder voltar atrás, caso o decida.

Então, em que construo meus sonhos? Na razão, pura e dura? Como estás diferente, SER… Reconheces-te?

 

Ergo-me como uma torre de babel, num espreguiçar que deixa as nuvens pelos tornozelos. Voto minhas preces ao dEUS do concreto e do comum. Quero alcançá-lo, ter a sua experiência, conviver com ele e - se necessário - perecer às suas mãos, para renascer, qual Fénix do regresso ao SER que hoje abandono.

Adeus Roma e romantismo, parto para a Babilónia do pragmatismo… Vou construir a minha torre!

 

O alicerce cumpre-se e parece forte. Na argamassa do entendimento deposita-se a água da cumplicidade, o cimento da experiência, a areia fina do esclarecimento, numa mescla de sentimentos e realidades.

Cada degrau, cada patamar anuncia-se na progressão do querer. A cada pedra, uma almofada de amparo. É o edifício construído com materiais fortes mas também com carinho.

Aparelho as pedras com alguma insegurança. Não domino ainda a arte de pedreiro nesta nova realidade. Confio manter a estrutura com a intrepidez inicial. Creio manter unos todos os fragmentos que a compõem. E, principalmente, evitar a “confusão de línguas e dialectos” que a venham a minar.

 

Esta torre não anseia pelo paraíso, procura apenas uma vida acima do nevoeiro da rotina e do aparato comum do ideal social.

 

E isto não é o que todos nós ambicionamos?

XXIII VI MMVI

Andarilhus

 

“Let me come inside your ivory tower
let me come inside your hallowed walls
God, it's heaven in here
fix me with your hand of grace
fix me with your touch of precious thrill
your fingers dance across my skin
reaching out for the pride of man”

The Mission: “Love me to Dead”.

música: Tower of Strenght (The Mission: "Children")
publicado por ANDARILHUS às 08:26