1 – A consciência do ERRO: esconjuro da obra do Mal
Introito
Neste Mundo partilhado entre indivíduos tão díspares, é natural que os dias vão colecionando sintomas de desajuste na concórdia inter pares e no equilíbrio emocional e social. Acumulamos tensões, desassossegos, desilusões, enquanto descobrimos também as nossas falhas, fracassos, limitações…
Frustrados nos sonhos (ou simplesmente desiludidos com o desvanecimento do cuidado e respeito expectáveis nos semelhantes, ou na soma de experiências que é a vida), perdemos, por vezes, sensibilidade e racionalidade no encaixe e na reação aos reveses. Permeáveis a tudo aquilo que nos afeta, esmorecemos o ímpeto, a temperança, o foco, com os quais nos guiamos pelos desejados “bons caminhos”. Amorfos ou negativamente reativos, acabamos por repostar ao nível do agravo com que nos consideramos atingidos. Pagamos na mesma moeda. Caímos no ERRO. E daí aos erros sucessivos é apenas um saltinho de pardal…
Se o sentimento de impunidade sobre a reincidência no ERRO não for irrevogável e se, numa encruzilhada de meditação, surgir a real oportunidade para uma íntima contrição e gradual arrependimento, a assunção de mea culpa aponta à porta de fuga da trincheira de defesa (e ataque) que tolhe os sentidos e abafa a comoção. Reativamos a escuta e a compreensão, mesmo que lentamente…
Assalta, então, a consciência de termos sido incorretos, indignos ou “pecadores”. Em ato de penitência, retiramos as pedras das mãos, as lâminas das palavras. Mesmo que tenhamos sido vítimas de ofensa e desaforo grave, e mesmo que continuemos com as feridas por suturar, para superarmos o nefasto estado de beligerância ou por interesses maiores que a nossa própria existência, recuamos, expomos o flanco ao opositor, com quem, agora, estendemos as conversações de armistício. Ou, no limite, comprimimos completamente a trouxa do orgulho e descemos ao soalho da humildade.
E quando a sensibilidade e a sabedoria do Homem não são suficientes, dispostos a tudo, crentes, agnósticos ou mesmo ateus, recorremos às forças supletivas, misteriosas, isotéricas, transcendentes a este palmo de terra e à realidade mundana do Ser Humano. Dirigimo-nos ao poder metafísico, intemporal, às dignidades venturosas do Bem, rogando pelo exemplo da sua santidade e pela intervenção em auxílio e correção da nossa práxis imperfeita. Saudamos, respeitamos, endereçamos louvor a estes sanctus advogados a quem pedimos luz, inspiração, e a mediação pelo perdão divino e humano.
As sensações de força e poder (quase) desaparecem. Porém, surge uma paz interior que nos embala em harmonia com o nosso sentido e lugar no referido Mundo partilhado. Reajustamos na dignidade e na virtude.
É então que procuramos reconstruir as pontes, elevar acordos, resgatar os afetos, refazer os laços, reconquistar os abraços… ressuscitar para novo ensejo.
Assim seja.
Jorge Pópulo