Grão de Pó; Fermento de Vida
http://sulanorte.blogs.sapo.pt/arquivo/
… O Pó alguma vez assenta? – Perguntam-me. Respondo: sim, mas de forma fugaz e fragilmente. Estamos submissos a poeiras e produzimos os nossos próprios pós, incessantemente e com um prazer inveterado e cego… ao encontro das tempestades de areia… por vezes já avisados, mas propensos ao risco e ao flagelo…
“Do pó se ergue para no pó jazer
O pó...,
Conserva a memória no espaço fugaz do tempo.
As lembranças, irrequietas, despertam de sono profundo;
Saem de casulos celestes, sedentas, de volta ao mundo!
A noite, em consolo, deflagra os dias do passado.
O pensamento solitário revê-se em feliz companhia.
Mexem-se os membros em vã tentativa de alcançar o sonho,
Insinuam-se gestos e intenções de nova fantasia!
Encontra-se o objectivo sem objecto, auto-sugestionável em realidade virtual,
Revoltado e descrente no destino abençoado do Homem:
- “Outrora prometias-me que nunca me deixarias entregue à solidão,
E, agora só, questiono-me se terás alguma vez existido!...”
Porém, apagada para a verdade, a luz iluminava o vácuo da alma.
Forte era a energia que alimentava a tocha sagrada.
Mas quanto mais intensamente explodia em brilho,
Mais estremecia bruxuleante com a visão da passagem do vento da mudança...
Desfalecia, rendida, a singular chama, possessa por sua crescente sombra.
A dor, como toupeira, cavava às cegas um buraco sem fundo,
Em fuga, desesperava pela passagem para uma diferente dimensão da realidade.
Já não sentia o corpo, procurava apenas libertar o espírito do perverso mundo.
Num estrebuchar final, a raiva do trovão esventra o campo florido.
Quando a cor e o perfume ainda se acreditavam eternos,
Folgavam de vida na serenidade do vale do tempo suspenso.
Ingénuos, sucumbiram à fúria de um amor falido...
A tristeza incontida nos pulmões da brisa pacífica
Mortifica-se então na força destruidora dos demónios de um tufão.
Esvazia-se o peito da terra em cadavérico corpo, após a visita terrífica!
Da água nasce a estéril semente da desertificação...
E nova vida deve recomeçar do pó...
XXVII : VIII : MCMXCVII
J. Pópulo”
Andarilhus “(º0º)”
IX : X : MMVII