Expor e ouvir, suporta a concórdia: olhar para o céu e estar atento à súplica das nuvens negras evita-nos a chuva triste...
Sai! E subi… subi os alcantilados dos picos da divisão do mundo. Em doce maneio, agito a insígnia da determinação. A decisão aponta-me um horizonte que não pára de crescer.
E tu, tu podes ser o pêndulo do meu equilíbrio: Podes ser o meu sentimento mais apurado; Podes ser o meu círculo mais perfeito. Por ti, abafo os maus pensamentos que me apoquentam e desejo ser um homem melhor, um ser humano digno da sua condição.
E eu, para ti, posso ser companheiro. E, deitada, já não precisas de adormecer virada para a parede. Do outro lado, já não está o vazio e a tristeza…
Desmancha-se o nó; rebola-se o novelo. Abre-se o livro, um novo livro, ainda a aguardar posteriores e excelsos capítulos, que agucem a leitura. Começa por um posfácio, interlúdio para uma nova ordem, para uma jornada no tempo. Dobra-se o tempo, e mais do que uma inversão da sua marcha, aqui se vai recuperar uma história de embalar… os passos perdidos da fortuna.
“O verde dominava, aqui e ali pintalgado de algum cinzento granítico. O silêncio do céu também enchia a paisagem, aqui e ali rasgado pelo correr maroto de um riacho atrevido.
O Vale da Existência Primordial era consagrado à reserva da essência da vida deste martirizado corpo celeste. Conseguira-se esse mínimo de concórdia entre os líderes dos Homens. Um corpo de sacerdotes cumpria a responsável tarefa de vigilância deste espaço sagrado. Para além dos sacerdotes, só Gondorilhus e Coleana representavam a espécie humana neste templo da criação.
- “Achei-te pensativa, ontem, ao final da tarde, quando contemplavas no horizonte a infusão marítima, cada vez mais ténue, entre a terra e o céu...”.
Coliana, recuperando a memória do dia anterior, pausou a voz em suspiro: - “Gondorilhus, contemplar o Céu e a Terra num ponto distante do mar, leva-me ao quarto escuro... onde o baú dos sonhos...continua...fechado...com medo de abrir...”.
Irrompe a inquietação de Gondorilhus, perdido no tempo e sentindo o chão fugir-lhe sob os pés: - “Que revelará tal atrevimento? Devemos despertar o passado do mundo ou buscas os meandros misteriosos da passagem dos portões dourados do futuro?”
E com isto Gondorilhus deixou render sua mão sobre o ombro de Coliana, não sabendo se aquele era um gesto de contenção ao impulso da amiga ou um sinal de companhia por viagem a um insondável destino...
Coliana sentiu a mão firme de Gondarilhus no seu ombro. Mesmo sem o querer, aquele baú que teimava permanecer encerrado, abriu-se e o mais simples sonho saiu, como se naquele momento fosse possível... tinha encontrado o companheiro de viagem...
Gondarilhus sentia-se privilegiado por conhecer Coliana desde tempos cuja memória se havia perdido. Esta sempre o acompanhara no seu mais profundo ser e não passava um dia pelo templo da mais viva lembrança em que aquele infeliz amordaçado não exaltasse as suas preces por aquela que tanta felicidade lhe trazia, arrancando-o, copiosas ocasiões, de precoce morte.
No entanto, Gondarilhus receava ser o advento de tempos nefastos. Não poucas vezes pedia a Coliana: - “Fogo – cognome que, com carinho, atribuía a Coliana – afasta a minha imagem do teu coração e meu nome de teus lábios, pois eu sou a destruição!”.
Mas era exactamente pelo contrário que fervilhava o seu sangue. O pensamento levava luta tenaz pelos prados do querer. Peleja infindável e sem resultado previsto. Desaparecer e deixar-se morrer seria, talvez, a solução mais fácil. Mas, importava agora não faltar a Coliana e acompanhá-la na sua demanda, enquanto a força não o abandonasse.
A força de Gondarilhus fazia manter a chama da vida acesa no coração de Coliana. Sabia que encontrara o seu companheiro, aquele que, por muito tempo havia esperado. Coliana sentia um amor inquebrantável no seu coração, que lhe fez apagar todas as lembranças de dor e infelicidade que outrora sentira.
Apesar de viverem felizes, Coliana sentia algo no seu inconsciente que lhe atormentava a alma: tinha o profundo desejo de saber de onde viera, porque razão fora ali parar. Decidiu empreender uma luta com um passado que lhe tinha causado algum sofrimento, pois sabia que o seu caminho era esse se quisesse encontrar respostas para as suas perguntas. Depois de ter pedido a Gondorilhus que a acompanhasse, decidiu partir em busca das suas raízes."
… E partiram… Aguardemos as novas da jornada, profetizadas e cumpridas em vicissitudes agridoces. Os arautos do vento logo revelarão os feitos destes dois…
IX VIII MMVI
Andarilhus