Sexta-feira , 30 de Julho DE 2010

Por Ti Seguirei... (8º episódio)

 

http://www.galiciaguide.com/Dolmen-of-Axeitos.html

 

 

(continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/36591.html)

...

 

Um pouco antes de raiar o dia, já a maioria dos indivíduos se erguera e o acampamento estava praticamente desmantelado.

Ainda pairavam no ar os fumos e as folias e as risadas da noite anterior. A tensão escorrera tão rápido como a cerveja e o hidromel e, na nova alvorada, os olhares estavam descontraídos, embora algo toldados e doridos, por força dos excessos.

Rubínia quase esbarrou em Zímio quando saia do abrigo improvisado. Na verdade, o lacaio acompanhara o círculo total da Lua no céu da noite, enquanto zelava pela segurança da sua senhora. A paz parecia próspera, mas nunca se poderia ter a certeza… Dormitaria mais tarde no dorso do cavalo, assim que alcançassem planície aberta.

Decorrido algum tempo, o necessário para terminar a preparação da viagem, a toma de algum alimento e o ensaio de alguns gestos – raros – de higiene, Alépio convocou os ilustres para planearem a etapa seguinte.

Resolveu reuni-los junto a um grande monumento, construído por gentes de tempos longínquos. Pareciam mesas imponentes. Feitas por gigantes, certamente. Para lá dos Montes Pirenaicos chamavam-lhes dólmenes e diziam que marcavam locais sagradas. Queria assim, Alépio, impregnar o momento, de memória dos acontecimentos ocorridos na noite anterior e de decisão sobre os dias que se seguiriam, com o halo divino e dar-lhe um cunho cerimonial.

Foram lestos a responder ao chamado do líder da expedição. Gurri, acompanhado por Urtize, deu por finda a espera e o início da assembleia. Dirigiu-se de imediato aos presentes: - “Agora que estou pela vossa causa, enviei dois emissários ao chefe supremo do meu povo. Irão testemunhar as façanhas aqui vividas e comunicar a razão dos meus votos e obediência a Rubínia, a partir de hoje. Comigo, seguem também os meus homens, cumprindo a tradição da partilha das sortes.” Sentou-se num marrão de granito, com travesseiro de musgo.

- “Não te tenho por súbdito, Gurri”, disse Rubínia, com um leve sorriso. - “És - como sempre foste – livre. Um guerreiro morre se lhe suprimirem a liberdade. E é nisso que quero que me ajudes: não deixarei que Tongídio continue preso pelos miseráveis Romanos. Morrerá pela simples sujeição, morrerá pela condição de cativo. Revela-nos agora o que sabes sobre o grupo do meu marido”.

- “Muito bem, assim o farei. Dei a minha palavra. E não só vos darei notícia do que se passou após a emboscada, como irei convosco até ao local onde os têm enclausurados. Mas teremos de ser rápidos… Podem partir a qualquer momento.

Após o assalto traiçoeiro dos Romanos ao corpo expedicionário de Aníbal, os Cartagineses e aliados que sobreviveram fugiram e dispersaram para a Ibéria, pelo sopé dos Montes Pirenaicos. Os algozes que os perseguiram pretendiam dar um golpe fatal ao General, porém não o conseguiram alcançar e viram escapar muitos dos seus guerreiros para Sul. Com isso, perderam a época própria para atravessar a montanha, de regresso aos domínios de Roma. A solução foi construir alguns campos fortificados para passarem o Inverno.

Para desgraça das nossas pátrias, os Arévacos, falsos com os do seu sangue e aduladores com o inimigo, viram uma oportunidade de riqueza e expansão na amizade com o Romanos, tornando-se seus aliados. Os de Roma, astutos, aproveitaram-se da ingenuidade dos Arévacos para assentar bases de povoamento mais duradoiras e ficaram em permanência em solo peninsular. Assim, em vez de partirem os itálicos que por aqui estavam à espera do degelo, a Primavera acabou por trazer ainda mais Romanos pela rota Pirenaica. As terras que estamos prestes a trilhar estão, por estes dias, pejadas de colónias romanas, constituídas por gentes de todas as artes. Prósperas e que se fixaram rapidamente como raízes de silva, propagando-se pelo terreno como praga daninha.

Não é minha a decisão, mas se mantiverdes os planos, ireis ao encontro do vosso fim. Os Arévacos aguardam-vos, com os Romanos novamente emboscados”.

- “Malditos! Preparam-se para nova ignomínia!” – vociferou Alépio. - “Desta vez não vão ter o sacrifício dos incautos, por Larauco! Eles é que serão espezinhados, como baratas entre mós de farinha… E a ti o devemos, Gurri. Obrigado, serás credor da nossa amizade e esforço, sempre que necessário”.

- “E… sobre Tongídio?” – perguntou Rubínia, em timbre cortado, pálida e apreensiva com tudo o que ouvira.

O Vacceu olhou para a interlocutora: - “Pois, Tongídio e os restantes… É por isso que temos de ser céleres. Sabemos que pretendem levá-los para Roma, como escravos destinados às tarefas mais árduas e exigentes: as galeras e as lutas de gladiadores.

Como têm receio das trirremes de Cartago, não ousam fazer-se ao Mediterrâneo. Vão efectuar a viagem por terra. Assim que acumulem tropas suficientes do lado de cá, parte um grupo com os prisioneiros para Roma”.

- “E sabes o local exacto onde estão, Gurri”.

- “Sim, Rubínia. Temos laços de parentesco com os Arévacos. Alguns dos meus familiares que com eles vivem relataram com grande precisão a localização e as condições do cárcere desses prisioneiros. Reuniram-nos num campo entrincheirado e bem guardado, próximo da entrada nos Montes Pirenaicos. Têm uma forte guarnição, porém estão por sua conta própria: o campo romano mais próximo fica a 2 dias de marcha”.

Alépio tomou a palavra: - “Julgo ser de bom senso considerarmos que, face à actual situação, o movimento de um grande número de soldados pelo território inimigo será instigador de reacção dos Romanos. Temos de os manter na expectativa da nossa chegada à sua armadilha, contorná-los por Sul e aproveitar essa sua distracção para libertar os prisioneiros, na sua retaguarda. Como poderemos concretizá-lo? Bem julgo que temos de ser ainda mais ardilosos e intrépidos do que os legionários”. – Disse com olhar matreiro …E passou à explicação do seu plano.

Alépio decidiu que encaminharia o grosso da hoste ao encontro de Aníbal, em Nova Cartago. Ele e algumas dezenas de homens do seu clã, apoiados pelo grupo de Vacceus, iriam acercar-se do campo romano onde retinham os prisioneiros, procurando resgatá-los. Lá chegados e conhecedores das circunstâncias, pensariam na melhor forma de o realizarem.

Gurri sugeriu enviar alguns dos seus homens junto dos Arávacos, como vanguarda. Desta forma, garantiam ao inimigo que as tropas de Aníbal seguiriam, ingénuos, direitos ao engodo. Contudo, os Vacceus informariam que estavam atrasados por razão de serem mal liderados, tremendamente desorganizados, porquanto se debatiam com disputas internas. Dariam uma imagem de serem uma presa fácil, iludindo-os no esforço da cilada ou mesmo na iniciativa de ataque e afastando-os dos acontecimentos que se iriam passar a Nascente.

Todos aprovaram a ideia.

Foi em vão que Alépio tentou persuadir Rubínia a acompanhar o grosso da força até Nova Cartago.

- “Pelos deuses se não estarei no local certo quando Tongídio reencontrar a liberdade! Partamos o quanto antes, para aproveitar bem a luz do dia. Quero estar com o meu marido daqui a 10 luas!

Irredutível, Rubínia saltou para a garupa do cavalo e colocou-se em posição de marcha. Zímio secundou-a. Alépio e os presentes, inclusive o sisudo Gurri, deixaram escapar uma leve risada.

Com os preparativos para a jornada terminados, fizeram-se ao caminho já a manhã se aproximava do seu meio-termo. Seguiram para Sul, com excepção dos Vacceus que foram directos ao inimigo, para Leste. Urtize conduzia este pequeno grupo.

A coluna traçou a direcção mais curta para Nova Cartago. Continuaram todos juntos durante dois dias. Já na meseta central da Ibéria, Alépio entendeu que estavam a Sul o suficiente para que os Arévacos e os Romanos não dessem pela sua passagem.

O contingente seleccionado dirigiu-se então direito aos Montes Pirenaicos e ao destino que tinha por missão. A coluna principal continuou para Sul, liderada por Frojo, braço direito de Alépio.

Ao fim de mais três dias, surgiram aos longe uns cabeços sombrios no horizonte. Eram os topos dos Montes Pirenaicos. Em breve chegariam à sua base. Nessa noite, o acampamento já estaria bordejado pela montanha íngreme.

Enquanto tomavam uma refeição frugal, para evitar acender fogueiras, começaram a comentar o que se seguiria. Um luar brilhante substituía o fogo, como iluminação.

- “Pela informação do pastor com quem cruzamos durante a tarde, o campo fortificado romano localiza-se a meio dia de marcha deste ponto. Proponho que o alcancemos já amanhã, pelo zénite do Sol. Lá chegados, observaremos as redondezas e o aparelho militar. Se for possível, arranjaremos maneira de nos esgueirarmos lá para dentro, para recolhermos o máximo de informação possível”, assegurou Alépio, acolhendo a aprovação de todos.

E as conversas ficaram por ali. Cada qual remeteu-se ao silêncio e adormeceu a imaginar todas as possíveis variantes da aventura do dia seguinte.

 

(continua...)

 

Andarilhus

XXX : VII : MMX

publicado por ANDARILHUS às 08:48
Quarta-feira , 28 de Julho DE 2010

Derrubar os Nossos Muros

https://1.bp.blogspot.com/_ZLf-1g2tFso/SoMsCTqA-4I/AAAAAAAAAxE/PLX5X6j1v2U/s1600/pizdaus_plantinha_muro1.jpg

 

O berço de madeira

Herdado

Era exíguo para o sono

E mais parco ainda

Para o sonho.

Espigou assim mesmo

No casario de velha soleira

Arrendado

Em esforço e de pouco abono

Mas sob a abóbada linda

De carinho risonho.

 

O bairro de granito

Escondido

Tinha uma só saída

Estreita, para a cidade

E mais apertada todavia

Para o futuro.

Ousou furar o gueto e espreitar

Para além do social tapamento

Para além do imposto mito

Surpreendido

Ficou, pela cor, pelas formas, a vida

Jamais vistas na sua tenra idade,

Pleno de perguntas e energia

Determinado em saltar o muro!

 

Num certo dia

Trespassou as barreiras

Com pequenas passadas,

Com grandes desafios.

Desde então,

Sem excepção,

Procura atravessar as soleiras

Que lhe retinham, ocultadas,

Em mundo de atrofios,

A saída para o sonho

A entrada para o futuro…

Sem esquecer, com emoção,

O Berço, o Bairro, o Muro,

As vivências latentes no coração

… E aquela abóbada linda

De carinho risonho.

 

Andarilhus

XXVIII : VII : MMX

publicado por ANDARILHUS às 18:50
Quarta-feira , 21 de Julho DE 2010

Remos de Vida por Mar Inóspito

http://cogitamundo.files.wordpress.com/2009/06/tempestade-no-mar1.jpg

 

 

Em deriva segue o batel

De remos caídos

E velas quebrantadas…

Sente saudade do flúmen de pêssego e mel,

Dos alentos de terra e das margens aveludadas.

Embalado em tempos idos,

Mais se desgoverna nas ondas de ouriço,

Acossado por ciclones de vespas feras:

Vem bruta a chuva de cascalho graúdo,

Violenta sobre o casco já açoitado

No ricochete das águas em reboliço…

Afeito, contorna as traições do seu mundo,

O revés movediço,

Vai fintando o mar furado

Que o seduz até ao fundo

Até ao fim…

Segue em abafado gemido,

De gonzo e pranto,

Gingando, apertado, em esgar fugido

Das voltas tentaculares do fluxo ferrugento.

Na busca da saída ou de um apaziguado recanto,

Acima, avista o céu de cobre em aluimento,

Que se abate como os cravos sobre a cruz…

E ali, no vórtice do horizonte minguante,

Como no covil da lombada de um livro,

Abraçados, nuvens opacas e oceano sem luz,

Esperam-no, nas asas de anjos negros,

Para se fecharem sobre as páginas da vida do errante.

Na crista da duna de espuma malfadada, dá rosto à dor:

Seguir em frente, direito ao ardil

Ou mergulhar logo ali, no silêncio?!

Sei lá!!...

Ai, a saudade do lago da (boa) fortuna,

De pêssego e mel!

E estes peixes de chumbo que me rodeiam,

Saltaricos ofensivos,

Abutres de amargura e desdém.

Vou despedir-me de infatigável escuna,

Descoser as tábuas de papel,

E afundar com os carrascos que me golpeiam

Tenazes e lascivos.

Já não vou mais além…

 

Andarilhus

XXI : VII : MMX

publicado por ANDARILHUS às 08:51
Sexta-feira , 16 de Julho DE 2010

Aqueles Que Instigam os Nossos Demónios Cativos

http://static.blogstorage.hi-pi.com/photos/fury.spaceblog.com.br/images/gd/1259879990/O-Que-Sao-Demonios.jpg

  

Não sou tempestade,

Nem vendaval.

Tão pouco incêndio

Ou irreverente vulcão.

Deixei há muito

O pensamento relâmpago

E a decisão faiscante.

Já ouço a idade

E açaimo o animal;

Já folheio o compêndio

E aceito que há Razão.

Fiz as pontes

Sobre os rasgões e cicatrizes

Dos meus pungentes Sismos!

Cosi os remendos

Sobre os buracos e nudezes

Dos meus loucos abismos…

Já chega… Já basta…

Não queiras que eu seja o que tu és

E aquilo que não quero ser.

Tenho cartilha, tenho visão

Próprias: Não as renego, não as enjeito.

Não movas a roda da fortuna,

Não faças tanger a roda dos órfãos

Em vã e egocêntrica esperança.

Não arejes os meus ventos esquivados,

Não atices os meus incêndios congelados,

Não abras crateras no meu vulcão adormecido,

Não aportes energia aos meus relâmpagos apagados…

Por favor,

Não instigues os meus demónios cativos!

Não saberei lidar com eles,

Não saberei controlá-los…

Serei um deles…

 

Andarilhus

XVI : VII : MMX

publicado por ANDARILHUS às 08:46

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