Sexta-feira , 10 de Setembro DE 2010

Por Ti Seguirei... (20º episódio)

 

http://www.nadaonline.net/forum/viewtopic.php?f=19&t=5715

 

(continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/49497.html)

Alépio posicionou os homens de acordo com o armamento disponível. Numa primeira linha, reuniu algumas dezenas de guerreiros com falcatas e os poucos escudos de que dispunham. Imediatamente a seguir colocou uns quantos homens com chuços pesados e compridos, que substituiriam as inexistentes lanças longas. Atrás e sobre uma suave elevação estavam então os lanceiros de pedras e os escassos arqueiros. Na última posição e já sobre a margem do rio, mantinham-se aqueles que não dispunham de armas, preparados para substituir os companheiros feridos ou mortos, reutilizando as suas armas.

A única vantagem disponível para os Celtas era saberem com precisão quem iam enfrentar. Ocupavam um lugar muito rochoso e irregular, pejado de árvores e arbustos. A cavalaria romana que se aproximava, para combater, teria de prescindir das montadas, sujeitando-se a uma situação difícil, uma vez que os cavaleiros não ostentavam os atributos de técnica e recursos mais apropriados para lutar como peões (não estavam equipados com os grandes escudos da infantaria e as armas de ataque eram mais ligeiras). Por outro lado, quem detinha esses predicados, a poderosa infantaria Romana, ia alongar a sua chegada ao planalto e tardaria a reunir em formação de batalha com efectivos suficientes. Se conseguissem rechaçar a investida inicial da cavalaria, poderiam ganhar tempo e vender bem cara a derrota. Era curta a vantagem, mas não displicente.

No extremo contrário do planalto começava a adensar-se uma nuvem de poeira. Sinal do grande movimento que se acercava. Uns atrás de outros, os cavaleiros desembocavam do trilho, como se saíssem de um buraco de túmulo, e agrupavam-se sobre o manto verde. Quando a formatura terminou, eram perto de 3 centenas de pontos cintilantes ao Sol, de armaduras bem polidas. Por alguns instantes só se ouviu o cantar vertiginoso do Ebrol, na sua prolongada queda pela serrania.

Verificados os rastros, os Romanos retomaram a marcha, em 6 colunas, direitos ao reduto Celta. Presumiam-nos nas cercanias, já que estavam sem cavalos, mas não desconfiavam que se haviam acantonado e se aprestavam para os enfrentar.

Não demoraria muito a que os inimigos encontrassem Alépio e os seus. Estes mantinham-se atentos e prontos. Cada qual passava pelo pensamento as imagens da sua vida e recordava os momentos e os entes mais queridos, alentando-se para a liça.

Tongídio estava na linha da frente da defesa e remoía-se de ansiedade para se atirar aos inimigos. A tatuagem do urso azul ganhava relevo no braço, como que se tivesse vida própria. Rubínia secundava-o e não arredava pé, por muito que o marido lhe implorasse para que recuasse para junto do Ebrol.

Chegados a meio do planalto, alguns cavaleiros dispersaram, adiantando-se ao grosso da força. Os legionários que sondavam o outeiro toparam com os Celtas e, logo ali, um deles foi a primeira baixa da rixa, com o rosto desfeito pelo arremesso de um fundibulário. Estavam abertas as hostilidades.

Os sons e o galope estridente resultantes desta escaramuça alertaram a formação dos Romanos que, após ordem superior, acorreram aos companheiros que desciam da elevação. Pararam no sopé desta, a alguma distância da área arborizada. Assim que o comandante teve conhecimento da localização dos Celtas, dividiu a hoste em grupos mais pequenos e ordenou que tomassem posição estratégica em volta do sítio. De seguida, de cada ponto do cerco, saíram vários cavaleiros, que se entranharam em força no outeiro, por todas as direcções, lançando uma chuva de dardos contra os barricados. No reduto, os Celtas abrigaram-se e aguentaram o ataque, obrigando depois os atacantes a recuar, ameaçados pelos longos e pontiagudos virotes de madeira e pelos projécteis. Os dardos dos legionários feriram 3 dos defensores, que foram imediatamente substituídos pelos guerreiros da retaguarda.

Entre os Romanos, as baixas foram bem mais significativas. A dificuldade de movimento dos cavalos entre as rochas e o arvoredo expunha por longo tempo homens e animais, alvos fáceis para as armas de arremesso. Os arcos e as fundas celtas provocaram morte e ferimento a vários soldados. Alguns ficaram a obstruir o solo junto à frágil fortificação, dificultando ainda mais a manobra dos cavaleiros activos. As investidas sucediam-se, mas redundavam sempre em fracasso e numa crescente disparidade entre os homens abatidos dos dois lados da contenda.

O chefe da cavalaria romana, Lucius Severinus, ambicionava ganhar o mérito e a glória de capturar os fugitivos que Marcus Minucius Rufus tanto desejava. Certamente que a recompensa seria excepcional. Talvez até o regresso a Roma e um cargo na magistratura. O ataque não estava a resultar: os cavalos não eram vantagem naquele terreno. E, tal como Alépio previra, decidiu forçar o andamento dos acontecimentos, ordenando aos seus comandados que desmontassem e atacassem os Celtas a pé, confiante que o número superior de efectivos seria suficiente para obter a vitória.

Lucios Severinus sentia a oportunidade a escapar-se-lhe das mãos. A infantaria já deveria estar sobre a subida para o planalto. Reuniu consigo uma centena de legionários e concentrou os restantes em duas filas circundantes ao morro e deu sinal para avançarem. Porém, estes, não estavam confortáveis com a situação e sentiam-se algo deslocados das suas funções de combate. Apenas com a gládio na mão e um pequeno escudo no braço, começaram a subir a encosta em linhas o mais cerradas possíveis que o relevo e os obstáculos permitiam. A meio da subida já estavam completamente desorganizados.

Em cima, Tongídio e companheiros aproveitavam a pausa para recuperar as barreiras e reforçá-las, utilizando mesmo os corpos dos legionários e dos cavalos liquidados. Chegaram-se à frente os guerreiros com os paus longos, na expectativa de mais um assalto da cavalaria.

Porém, quando alguém gritou que os Romanos voltavam à carga e que vinham apeados, rapidamente trocaram para as posições iniciais.

Desta vez, sim, não faltariam os combates corpo a corpo.

 

X: IX : MMX

Andarilhus

publicado por ANDARILHUS às 20:12

Por Ti Seguirei... (19º episódio)

 

http://gooutside.terra.com.br/Edicoes/24/imagens/bienvenido1_132.jpg

 

(continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/49191.html)

Uma longa mancha avermelhada movia-se em ordem e naquilo que parecia ser um passo único e simultâneo. Eram precedidos por fileiras de cavalaria, que formavam a vanguarda da legião e forçavam o passo. Estavam quase no local onde os Celtas tinham conversado com o pastor. A encosta dura que os apartava em distância e altura iria atrasar um pouco os legionários peões, mas a cavalaria seria lesta a galgar o obstáculo. O grupo cansado dos Celtas não poderia esquivar-se por muito mais tempo. Sentiam-se abandonados pelos deuses e carentes da sua bênção. A sorte não lhes sorria. Tinham talvez meio dia - ou mesmo menos - até que se vissem confrontados com os primeiros inimigos.

Alépio chegou-se ao centro do grupo, olhou para alguns dos ilustres dos diferentes clãs e também para Rubínia, procurando perceber os seus pensamentos e avaliando a reacção que se seguiria ao que iria propor. Respirou fundo e proferiu, em jeito de profecia: -“Tem sido um prazer e uma dádiva combater a vosso lado e partilhar a fortuna que nos é comum. Assim foi e assim vai continuar a ser. Morrer a vosso lado será mais um momento de grande júbilo. Estes Romanos não nos apanharão com vida. Vamos lutar até que os deuses nos levem para os seus domínios!

O grito de aprovação foi medonho. Os guerreiros estavam plenamente vinculados àquela espécie de irmandade e mais entendiam que uma morte digna era superior a uma vida infame de prisioneiro. Mesmo os que não dispunham de armas estavam dispostos a lutar, quer fosse apenas com os punhos, quer fosse com pedras ou estadulhos.

Rubínia, no íntimo, ainda deixou emergir a tristeza e a decepção. Tinha levado a cabo tamanho projecto para encontrar e salvar o seu amado Tongídio, e tudo se perderia num ápice. Não conseguiria levá-lo de regresso a casa. Contudo o seu ânimo elevado tratou de sarar as fragilidades e aceitar que, pelo menos, morreria ao lado dele. Estariam para sempre juntos.

-“Assim seja”, continuou Alépio. “Vamos entrincheirar-nos no outeiro ao fundo do planalto e preparar as defesas”.

Tongídio com Rubínia e alguns homens ficaram junto ao extremo da encosta por onde surgiria o inimigo, controlando a sua evolução de andamento. Os cavalos também estavam por ali, uma vez que já não seriam necessários. Apenas um foi levado para o sítio da última resistência. Teria um destino sagrado.

No outeiro, aproveitaram os afloramentos graníticos, complementando-os com pedras, troncos e ramos, nos espaços abertos. Fizeram assim, apressadamente, uma pequena cerca, que confinava a Oeste com o Ebro. No interior, acumularam rebos em quantidade, para as fundas e para projecção manual. Recolheram igualmente varas fortes, as quais afiaram e endureceram nas extremidades, aparando-as e queimando-as ligeiramente. Num espaço mais amplo, amontoaram algumas pedras mais afeiçoadas, que serviriam de ara sacra, onde ofereceram cerimonialmente o cavalo, aos deuses da guerra e da concórdia. Cumpriram os diferentes ritos, segundo cada povo ali representado, pedindo força, coragem e discernimento para a peleja que chegaria em breve.

Na retaguarda, para além do rio, prolongava-se o outeiro, e com ele, a fuga desejada mas impossível. O vão entre margens não era grande – cerca de 6 braçadas – mas a altura e inclinação do troço, quase em cascata, a força da corrente e o leito de rocha nua eram razão de morte certa a quem caísse na armadilha. Se pelo menos tivessem mais um dia de vantagem sobre os Romanos, poderiam tentar construir uma travessia. O corte das árvores necessárias sem as ferramentas adequadas era muito moroso.

Assim que Tongídio se apercebeu que a cavalaria inimiga se adiantava e iniciava a subida da encosta, reuniu os cavalos e atiçou-os bruscamente e em debandada pelo caminho abaixo e ao encontro dos que subiam. A confusão iria atrasá-los um pouco mais. Depois recuou com os demais para a improvisada fortaleza. Rubínia fez igualmente os votos à sua venerada Trebaruna, apertando firmemente o amuleto da divindade contra o peito.

Restava-lhes aguardar.

 

X : IX : MMX

Andarilhus

publicado por ANDARILHUS às 08:32

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