Por Ti Seguirei... (26º episódio...)
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(Continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/51029.html)
…
-“Ó Taulabro ajuda cá, a carregar este inútil. Pelo próprio pé não vai a lado nenhum e não vale a pena sujar este lugar com o sangue dele. Temos de o levar.”
Os dois grupos seguiram direcções opostas, sob os olhares curiosos de alguns transeuntes, atraídos pelo alvoroço e pela entoação grossa e ríspida. Tongídio foi encaminhado para fora da cidadela por uma porta secundária que dava para uma curva do rio e Rubínia passou pela torre, a qual tinha uma passagem secreta para o exterior da muralha. Ainda viu ao longe Bolota a acenar-lhe um adeus.
Reencontraram-se já próximos de um caminho algo camuflado pela vegetação. Os amigos aguardavam-nos, conjuntamente com Irineu e alguns dos seus.
- “Nas sacolas tendes pão, alguma carne seca e queijo, assim como odres de cerveja. Chegará para algum tempo. Já que quereis alcançar o território Vacceu, o trajecto mais seguro será seguir primeiro para Sudoeste, durante quatro a cinco dias. Só depois deveis virar a Norte, direitos ao vosso destino. Assim evitareis passar próximo de povoados que vos são adversos. E atenção que os Romanos espalharam vigias por todos os sítios, para além que os do meu povo vão ficar irritadíssimos com esta fuga e lançar-se-ão em vossa perseguição! Neste momento é tudo quanto posso fazer por vós. Agora partam e nós também temos de desaparecer: muito em breve darão conta da falta dos prisioneiros e dos guardas que os escoltavam.”
Gurri adiantou-se, saudou Irineu e agradeceu: -“Já muito nos ajudaram. Deram-nos a liberdade e, com isso, a possibilidade de continuarmos o destino que nos juntou. Espero em breve encontrar os Arevácos sob os teus desígnios e poder chamar-lhes de irmãos, a todos.”
Ajudaram o ferido a subir para o cavalo, que Rubínia conduzia pela rédea, bem junto do seu. Despediram-se e partiram.
Apesar de perigoso, aproveitaram a noite para se afastarem dos domínios dos Arevácos. A pequena coluna deslocava-se com lentidão por dificuldade do ferido. Zímio seguia na frente, o Bracaro e o Vacceu nas laterais. Correu bem a fase nocturna e na diurna usufruíram de um trilho muito arborizado que lhes concedia sombra e discrição a olhares alcantilados.
Repousaram apenas um pouco ao amanhecer e ao entardecer, para novamente beneficiarem da escuridão da noite. Apesar do movimento na garupa da montada, Tongídio recuperava normalmente. A ferida cicatrizava a bom ritmo e não havia indícios de infecção. Quando necessário, já caminhava sem grandes dores. Até mesmo aquela fome de lobo esfaimado emergia novamente.
Na imensidão da meseta central da Ibéria, isolados e sem contactarem fosse quem fosse por precaução, o grupo sentia-se um pouco perdido pelas paisagens estranhas. Na verdade, não sabiam que territórios percorriam. Decidiram então que já era tempo de rumar a Norte e arriscar uma visita ao lugar de gentes que primeiro lhes surgisse. Os mantimentos estavam igualmente quase esgotados. Passaram a circular em espaços abertos, atalhando caminho e evitando percursos mais longos. Reduziam distâncias mas também os níveis de segurança.
Seguiam por uma longa pradaria, ainda fresca pelo orvalho matinal e que molhava os pés de cavaleiros e refrescava a metade mais baixa dos animais, e eis que, ao longe, avistaram várias chaminés de fumo, que emolduravam o horizonte. Certamente uma aldeia ou cidadela, imaginaram. Finalmente iam saber onde estavam, falar com nativos e comer algo diferente. Pelo menos as fogueiras das casas estavam acesas…
Confirmava-se a existência de um povoado numa encosta anexa à planície. Pouco comum era não terem ainda avistado alguém, apesar de já terem visto algumas cabeças de gado e mesmo alguns pequenos campos lavrados junto a um riacho. Lá no alto, via-se o recorte de um pequeno castro, com as emanações de fumo.
O caminho que levava à entrada do sítio começava a revelar as razões da situação tão pouco habitual: viram os primeiros corpos e, por sinal, daqueles que trabalhavam os campos por onde tinham passado. As alfaias largadas pelo chão assim o faziam supor.
Puxaram das armas e continuaram a subir para o local que – agora sabiam-no – tinha sido um recente campo de batalha. Passaram a muralha e encontraram um cenário de guerra, com os habitantes mortos, espalhados pelo recinto central, sobretudo. Os agressores deveriam ter chegado de surpresa, sem permitir a preparação de defesas. Aquilo não era obra de um exército regular. O mais certo era terem sido atacados por um dos grandes bandos saqueadores que percorriam a Ibéria de lés a lés, como pragas. Verdadeiras pestes para os infortunados que escolhiam para assaltar. Não se contentavam em tirar o proveito material das suas acções. Pelo contrário, como forma de criarem reputação pelo medo, passavam todos à espada e queimavam tudo.
E assim também tinham feito ali: as casas ardiam e os seus proprietários jaziam por terra. Por bondade, Zímio, Alépio e Gurri utilizaram os fogos atiçados como piras funerárias, colocando os corpos inertes nas chamas. Rubínia e Tongídio procuraram e recolheram algum alimento. A operação foi demorada e só pelo meio da tarde é que abandonaram o nefasto lugar, seguindo a sua jornada.
Pelos rastros perceberam que os salteadores também haviam prosseguido para Norte, o que não era uma boa notícia. Exigia-se um permanentemente alerta.
Algum tempo decorrido, depararam-se com uma mulher que saía a correr de uma colina um pouco à frente, embrenhando-se num pequeno giestal de uma zona mais rochosa da planície. Logo de seguida, pela mesma descida desembestaram 4 cavaleiros, que a perseguiam. Perceberam de imediato quem eram.
O Vacceu e o Bracaro incitaram os cavalos a galope, direitos aos algozes. Zímio seguiu-os. Tongídio também se aprestava para arrancar, mas Rubínia demoveu-o.
Em breve, no meio do matagal, ouvia-se o metal a soar e depois alguns gritos de dor. Caíram 3 dos bandidos. O quarto indivíduo preparava-se para se escapar pelo caminho que tinha feito para ali, porém, Tongídio, prevenido e bem colocado, limitou-se a levantar horizontalmente a falcata, a correria do fugitivo fez o resto: corpo e cabeça tombaram desunidos.
Os três companheiros regressavam acompanhados por uma jovem mulher e mais dois cavalos excedentes.
(continua...)
Andarilhus
XXI : IX : MMX