Por Ti Seguirei... (29º episódio)

 

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(Continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/51891.html)

Os cinco Celtas e os Carpetas pararam para repousar a meio da manhã. Os cavalos estavam também esgotados com a exigência de passo rápido a que foram obrigados. Quando retomaram já a tarde se apresentava e o cansaço não se apagara, sobretudo nas mais jovens. Alguns dos resgatados, logo após montarem novamente, dormitavam, mesmo à cadência de galope.

Rubínia sentiu dó por aquela gente que havia passado agruras indescritíveis e afrouxou a cadência da viagem. Os outros perceberam e alinharam. A vantagem era razoável mas não decisiva para uma absoluta segurança. Tanto mais que Gurri fez sinal aos outros, indicando um ponto no horizonte, que brilhava como se fosse metal.

-“Julgo que estamos a ser seguidos e observados. Só ainda não percebi por quem. Quando passarmos naquela garganta ao fundo do vale, julgo que vamos saber quem são…”

Prosseguiram com algum constrangimento. O certo é que virar para trás seria a pior das decisões. Lentamente e sem parar, no seguimento de algumas palavras de Alépio, foram-se agrupando de modo a colocar os jovens ao centro, rodeados pelos guerreiros. Zímio e Rubínia lideravam a pequena caravana.

Ao entrar no desfiladeiro, onde se iniciava uma longa descida, prepararam as armas e seguiam prontos para um eventual confronto. Vigiavam os cimos das escarpas mas não toparam ninguém. Já fora do vale, voltou a surgir o brilho ao longe, para lá do fundão que unia os dois montes agigantados, o qual se aprestavam para atravessar. Quem quer que fosse, acompanhava-os à distância.

Desceram sem dificuldade àquele buraco desmesurado da terra. A subida que se lhe seguiu acabou com a réstia de energias de animais e de resistência dos Carpetas. Logo que acederam a um ponto alto, apearam-se e deitaram-se pelo chão. Os cavalos resfolegavam, escumados e sob uma grossa camada de pó e transpiração. Aliviaram-nos da carga e deixaram-nos a pastar e a arejar. A tarde ia adiantada mas ainda era cedo para assentamento nocturno. Importava continuarem um pouco mais e procurarem um bom sítio para acamparem.

Ficaram por ali algum tempo. Quando faziam intenção de retomar a jornada e carregavam os equídeos, Diália deu um grito agudo, de pavor: -“Ahhhhh, desgraça! Eles vêm além. Estamos perdidos!!!!

Eram os Velenos que emergiam do desfiladeiro, do outro lado da falha do relevo. Ainda não tinham parado, acossando as presas sem descanso. Como nómadas sabiam e faziam quase tudo sobre o dorso de um cavalo. Respeitavam-nos e conheciam-nos bem, gerindo os ritmos de marcha. Só assim conseguiam que os animais se deslocassem continuadamente, sem necessidade de parar.

Os fugitivos aceleraram a partida e arrancaram à pressa. Algo teria de ocorrer rapidamente ou seriam apanhados pelos predadores. Poderiam esconder-se, mas as hipóteses de sucesso eram muito baixas. Talvez, mais um plano genial de Alépio ou uma intervenção divina os salvasse. De qualquer maneira, agora, havia mesmo que fugir e manter distância.

Subiram mais um pouco e chegaram à entrada de um novo vale, com uma longa planície descoberta. Era o pior dos sítios para uma escapatória. Não tinham vegetação para encobrir a sua passagem e estariam sempre ao alcance da visão dos perseguidores.

Puxaram ao máximo por animais e humanos, numa corrida desenfreado e alucinada sobre o tapete de erva verde. Vencida a primeira metade do vale, vislumbraram ao longe uma linha de árvores esguias e encadeadas que ziguezagueava. Eram certamente choupos ou salgueiros, normalmente coroas de cursos de água.

Alépio viu ali a oportunidade que lhes poderia trazer alguma esperança.

-“Ali ao fundo deve haver um rio ou algo parecido. Temos de o passar a qualquer custo!”

Os Velenos eram cavaleiros formidáveis. Seriam talvez descendentes dos Centauros, seres admiráveis descritos pelos comerciantes e navegantes do Grande Mar Interior que se abria a Sul da Ibéria. Sem as montadas, sentiam-se incompletos e não passavam de guerreiros de valor medíocre. Era nisto que apostava Alépio – pelo menos, enquanto não tivesse outra ideia: apartar guerreiros dos cavalos, com o atravessamento do rio. Uma vez mais, a Senhora das Águas traçaria o destino.

Com os carrascos praticamente sobre os calcanhares, foi pedido aos cavalos tal desempenho que quase não tocavam com as patas no chão. O curso de água definia-se cada vez melhor. Ansiavam por o transpor. E ficaram muito perto de o conseguir. Contudo, um dos generosos animais não aguentou o esforço e caiu para o lado, atirando com um jovem Carpeta à distância.

Não havia sequer tempo para pensar. Os Celtas saltaram dos cavalos e encaminharam os Carpetas para o atravessamento do rio, cuja margem estava a alguns passos, enquanto enfrentariam os inimigos.

Diália conduziu os conterrâneos, superando a corrente forte do curso de água através de rochas que espreitavam à superfície. As margens eram altas o que impedia a passagem das montadas. Entretanto acercavam-se os primeiros Velenos e iniciavam-se as hostilidades.

Os Celtas começaram por usar os cavalos como escudos contra as investidas dos adversários. Escondiam-se das suas armas e investiam de baixo para cima furando as costelas dos atacantes. Tongídio não se protegia. Tomou um cavalo de um inimigo abatido e entrou nas fileiras inimigas como o vento do Inverno, circulando a falcata no ar incessantemente contra os inadvertidos e surpresos Velenos, abrindo verdadeiros corredores entre eles.

A desconcentração assim provocada permitiu aos Celtas galgarem para um afloramento rochoso, de fácil acesso para humanos, mas impossível para equídeos. Tongídio, em mais um vendaval de morte, juntou-se aos companheiros.

Os Velenos quase se mordiam uns outros de furiosos que estavam. Esqueceram-se das vítimas Carpetas e concentram todo o fel sobre aqueles cinco empecilhos que lhes estragavam a vida regalada que tinham. Sem reflectirem, apearam-se e atiraram-se à fraga onde queriam consumar em morte dolorosa o ódio que os movia.

Os Celtas esperavam-nos em círculo para cobrir melhor o espaço defensivo. Rubínia desabafou: -“Meus caros, mais uma provação. Que o nosso sangue mova diligentemente as lâminas que farão correr o sangue deles. Se nos safarmos desta também, temos muito a agradecer aos deuses. Ai, Tongídio, quando nos deixarão regressar a casa e viver uma vida calma e próspera?!” Soprou-lhe um beijo, mesmo antes de ter descarregado a espada sobre um atacante.

(continua…)

 

Andarilhus

XXVIII : IX : MMX

publicado por ANDARILHUS às 22:12