Quinta-feira , 14 de Outubro DE 2010

As Trovas da Derrota

http://nacht-verdunkeln.blogspot.com/2010/01/reflexoes-sobre-o-tempo.html

 

 

Se me prostrei pelo favor de Deus

Se me vendi pelo ardil do Diabo,

Se, com tamanhos patronos,

Não consegui tocar a tecla que te faz agitar

Na cerca que te afasta,

No conforto que te atrofia,

Deixo-me, por aqui, embrulhado

Em novelos de memórias

Que, de labaredas se fazem cinzas

Sonolentas, sentadas em paragens

Aguardando pelos ventos da partida.

 

Esta não será uma canção de tristeza;

Esta é uma trova de anúncio

Da derrota,

Na inanição, na acção

Quieta de pensar que mexi e remexi

Todos os cordelinhos, mas não alcancei

Como, contigo,

Se faz o nó.

 

Liga-se o dia, desliga-se a noite,

Reencontra-se o amanhecer

Sempre na mesma hora, no mesmo sito,

Na semelhança repetitiva do tipo e da forma.

Já nem parece mais do mesmo,

Já nem parece, apenas acontece…

Soterrou-se a defesa abaixo da paliçada

Das palavras, da conversa, dos concílios ocos.

Entregou-se o campo dos lugares comuns

Para domínio dos vencedores,

Aperto-me a um canto onde não perturbe

Enquanto espero na paragem

Pelos ventos da mudança.

 

Esta não será uma canção de tristeza;

Esta é uma trova de acolhimento

Da derrota,

Na inanição, na sujeição

Quieta de pensar que abri, fechei

A sepultura, mas não alcancei

Como, contigo,

Se vive ou se morre.

 

Estalou a capela onde

Tantas vezes

O empenho tentou ganhar o altar,

Devoto a prometida tão elevada,

Cuja fragrância se conheceu,

Pelos breves trechos

Em que desceu ao lugar de apóstolo,

À consciência do outro.

Mesmo o Santo,

Que não respire o odor do(a) ca-fé

Na sua morada

Sucumbe à Íntima vontade de aceitar

Um “sim-(que)-vale-hino”

De quente conversa e sermão com os peixinhos

… Que se chegam à barca, porque

 

Esta não é uma canção de tristeza;

Esta é uma trova de paixão

Pela derrota,

Na esperança, na calma

Sóbria de pensar que coberto ou nu

De crença, sempre me ergui

Quando, comigo,

Me confrontei.

 

Esta não é uma trova… é um fado.

 

Andarilhus

XIV : X : MMX

publicado por ANDARILHUS às 21:37
Sexta-feira , 01 de Outubro DE 2010

Por Ti Seguirei... (30º episódio)

 

https://farm4.static.flickr.com/4133/4965638470_2094ccd8b1.jpg

 

(Continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/52019.html)

Os Velenos eram bem mais “tenros” que os Romanos. Mal equipados e sem táctica ou organização militar, combatiam individualmente, animados por um espírito quase animalesco. Tinham tanto de bravos como de ingénuos, na arte das armas. Apenas a energia os movia.

Apesar de se acharem em número avassaladoramente superior aos Celtas, estes desmultiplicavam-se bem e com alguma facilidade no repelir dos ataques. Na sua posição estratégica superior, enquanto lhes sobejassem forças, dificilmente seriam derrubados.

O problema é que os perseguidores não tencionavam desistir e acometiam vezes sem conta, tanto mais que a maior parte das investidas terminava apenas com uma escorregadela e subsequente queda da penedia. Sem grandes danos, os guerreiros levantavam-se e atiravam-se novamente aos que se defendiam acima. Também por isso, Tongídio e os companheiros não conseguiam infligir males maiores porque os inimigos não se aguentavam muito tempo sobre a “ilha” rochosa. Lutavam incessantemente mas sem resultados de baixas. Iriam acabar mortos ou capturados por fadiga. A situação estava deveras difícil. O único alívio era saber que os Carpetas tinham escapado. Não tinham de se preocupar com eles, por ora.

-“Há que dar rumo a este impasse. Se temos de morrer, levaremos alguns deles connosco, enquanto temos alento. Aqui vamos acabar por definhar… Olhem, ali há outro afloramento granítico que encosta àquela escarpa. Se conseguirmos chegar até lá, podemos depois procurar a fuga subindo ao alcantilado.” Gritou Gurri, entre duas espadeiradas.

O Vacceu referia-se a um outro patamar de granito, similar àquele que ocupavam e que, daí, distava uns 30 passos de corrida. Todos acenaram positivamente.

-“Primeiro vou eu, seguem-me Zímio e Rubínia, depois Alépio, e Tongídio cobre a retaguarda. Estão prontos?

Todos deram um grito afirmativo em uníssono. Gurri saltou do rochedo e começou a cortar tecido nas roupas e nos corpos dos oponentes que lhe surgiam pela frente. Começaram a cair os primeiros Velenos. Seguiram-se os companheiros pela ordem combinada. Os adversários deixaram-se surpreender, mas rapidamente reagiram, passando em volta da fraga até ao lado da fuga.

Por essa altura já os três Celtas da frente alcançavam o segundo maciço rochoso e Alépio, seguido de perto por Tongídio, corria para lá. Mudou então a fortuna, transformando aquilo que parecia redundar num sucesso, numa situação que lhes abria as portas para o além.

O Bracaro tropeçou num buraco de toca de animal, escondido sob a erva, e estendeu-se ao comprido. Tongídio, ao vê-lo pelo chão, procurou levantá-lo mas teve de se defender e defender o amigo, já que os perseguidores chegaram rapidamente. Os restantes, instintivamente, saíram da posição confortável e acudiram a Tongídio.

Não demorou muito a estarem completamente cercados por mais de meia centena de homens famintos por vingança. As hostilidades interromperam-se por um momento de silêncio e contemplação, como se acordassem um pacto cerimonial de prefácio para os acontecimentos prestes a desencadear-se. Uma pequena clareira a toda a circunferência apartava os Celtas dos seus carrascos. Sentiam-lhes os cheiros, tão intensos como os dos dois que Tongídio tinha apagado para a vida. Depois de tantos riscos e circunstâncias complicadas, seria assim que acabariam?

Rubínia apertou o braço de Tongídio e sussurrou: -“Partimos juntos…” Beijou-lhe a tatuagem do rosto. Olhou para os seus companheiros, um a um, e despediu-se sem falar. Compreenderam-na bem e responderam da mesma forma.

Os Velenos começaram a agitar-se e dar mostras de iminente assalto. O assalto final. Uma vez mais, os Celtas puseram-se em guarda, formando um círculo. Cairiam muitos atacantes antes que eles tombassem também.

No instante em que se ia quebrar aquele adiar, abateu-se uma nuvem de setas sobre os agressores, ao mesmo tempo que um contingente de cavalaria assomava ao local, a grande velocidade.

-“Os Vetões! Os meus parentes Vetões!” Gritou Tongídio, reconhecendo os sinais. –“ A eles, vamos acabar com esta corja de saqueadores! Temos reforços!”. De presas passaram a predadores.

Como cães selvagens, os Celtas descarregaram toda a tensão sobre os Velenos mais próximos, perseguindo-os, quando estes só já procuravam os cavalos para abalarem. Contudo não puderam evitar o confronto, ficando por sua vez apanhados entre o martelo da cavalaria Vetã e a bigorna que era o rio. Os Vetões iniciaram a carga, secundados pelos Celtas, também já sobre montada.

Num curto período, o campo verde da planície ficava tingido do vermelho do mosto da existência e pejado de corpos, pasto para abutres e grous. Os Velenos haviam sofrido um rude golpe, deixando para trás mais de metade da sua hoste. Para futuro teriam de reconsiderar o seu modo de vida.

-“Talauto, meu grande rufia, apareces na melhor das oportunidades! Meus amigos, eis a origem dos pontos brilhantes no horizonte: os indomáveis Vetões!”

(continua…)

 

Andarilhus

XXX : IX : MMX

publicado por ANDARILHUS às 21:25

BI

pesquisar

 

Outubro 2010

D
S
T
Q
Q
S
S
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

posts recentes

últ. comentários

  • Cara Otília Martel,agradeço a visita, a saudação a...
  • Há anos que aqui não entrava. Ou antes, tinha perd...
  • Obrigado!Depois, publicarei os dados/relatos das j...

mais comentados

Tombo

Visitas

Viagens

Chegar-se à frente

subscrever feeds

blogs SAPO


Universidade de Aveiro